Rev. Tec. Cient. CEJAM. 2025;4:e202540040
Autoria
Francis Henrique do Nascimento Tsurumaki1
ORCID: https://orcid.org/0009-0003-0043-786X
Ernani Pereira da Cunha1
ORCID: https://orcid.org/0009-0004-3006-5507
Samuel Nilo Vieira1
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-4020-3438
Fernanda Cardoso Fernandes1
ORCID: https://orcid.org/0009-0001-4306-3189
Adrianne Stein1
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-9117-5687
Instituição
¹Centro de Estudos e Pesquisas Dr. João Amorim (CEJAM), São
Paulo, Brasil.
Autor Correspondente
Francis Henrique do Nascimento Tsurumaki
e-mail: francis.tsurumaki@cejam.org.br
Como citar este artigo
Tsurumaki FHN, Cunha EP, Vieira SN, Fernandes FC, Stein A.
Teleconsultoria por aplicativo entre níveis de atenção em saúde
bucal no SUS: uma avaliação de implementação. Rev. Tec. Cient.
CEJAM. 2025;4:e202540040. DOI:
https://doi.org/10.59229/2764-9806.RTCC.e202540040.
Submissão Aprovação
01/09/2025 02/10/2025
Relato de Inovação Tecnológica
Teleconsultoria por aplicativo entre níveis de atenção
em saúde bucal no SUS: uma avaliação de
implementação
App-based teleconsultation across care levels in oral health
within Brazil’s SUS: an implementation evaluation
Resumo
Objetivo: Avaliar a implementação de um programa de
teleconsultoria via aplicativo de mensagens entre equipes da Atenção
Primária à Saúde (APS) e especialistas em saúde bucal, quanto à
resolutividade na APS, priorização clínica e integração com a
regulação em rede municipal. Método: Estudo observacional,
retrospectivo, de avaliação de implementação. Foram incluídos todos
os casos discutidos entre agosto/2021 e julho/2025 (n=226).
Resultados: A demanda concentrou-se em Estomatologia (46,0%)
e Pacientes com Necessidades Especiais (22,1%). A resolutividade na
APS foi de 31,0% (n=70), evitando encaminhamentos
desnecessários às especialidades. Entre os encaminhados (n=156),
60,9% (n=95) receberam priorização de urgência, indicando que o
canal capturou situações não triviais do cotidiano da APS e contribuiu
para acelerar o acesso dos casos graves; 28,2% (n=44) seguiram via
regulação, demonstrando integração do apoio imediato ao fluxo
formal. Não houve eventos adversos relacionados às orientações e
todos os registros permaneceram anonimizados. Conclusão: O
programa é viável, seguro e útil para qualificar decisões clínicas na
APS, evitar encaminhamentos indevidos, priorizar casos graves e
ordenar o acesso à atenção especializada. Os achados sustentam sua
manutenção/expansão e futuras avaliações prospectivas com
desfechos clínicos e econômicos.
Descritores: Atenção Primária à Saúde; Teleodontologia; Aplicativos
Móveis; Auditoria em Saúde; Saúde Bucal.
Abstract
Objective: To evaluate the implementation of a messaging app
based teleconsultation program between Primary Health Care (PHC)
teams and oral-health specialists, focusing on PHC resolvability,
clinical prioritization, and integration with the municipal referral
regulation system. Methods: Observational, retrospective
implementation-evaluation study. All cases discussed between
August 2021 and July 2025 were included (n=226). Results:
Demand concentrated in Oral Medicine (46.0%) and Patients with
Special Needs (22.1%). PHC resolvability was 31.0% (n=70),
preventing unnecessary referrals to specialties. Among referred
cases (n=156), 60.9% (n=95) received urgent prioritization,
indicating the channel captured situations that are not routine in PHC
and helped expedite access for severe cases; 28.2% (n=44)
proceeded via the regulation system, demonstrating integration of
immediate support with the formal referral flow. No adverse events
related to the guidance were identified, and all records remained
anonymized. Conclusion: The program is feasible, safe, and useful
to qualify clinical decision-making in PHC, avoid inappropriate
referrals, prioritize severe cases, and organize access to specialized
care. The findings support its maintenance/expansion and future
prospective evaluations including clinical and economic outcomes.
Descriptors: Primary Health Care; Teledentistry; Mobile
Applications; Health Audit; Oral Health.
Teleconsultoria por aplicativo entre níveis de atenção em saúde bucal no SUS...
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Rev. Tec. Cient. CEJAM. 2025;4:e202540040
INTRODUÇÃO
A Atenção Primária à Saúde (APS) é reconhecida como porta
de entrada preferencial e coordenadora do cuidado no Sistema
Único de Saúde (SUS), assegurando a longitudinalidade do
acompanhamento dos usuários(1-3). No âmbito das Redes de
Atenção à Saúde (RAS), a linha de cuidado é o arranjo
organizativo que explicita, de forma sequencial e integrada, as
ações e serviços necessários para atender um determinado
problema de saúde ao longo do tempo da promoção e
prevenção ao diagnóstico, tratamento, reabilitação e
contrarreferência. Ela define fluxos, critérios de acesso e
responsabilidades entre os pontos de atenção, garantindo
continuidade e integralidade do cuidado.
Na prática do percurso assistencial, o caminho do paciente na
rede inicia-se no domicílio e tem como porta de entrada a Unidade
Básica de Saúde (UBS), onde ocorre o acolhimento, a avaliação
clínico-epidemiológica e a estratificação de risco. A APS é
resolutiva na maior parte das demandas e mantém o seguimento
longitudinal. Quando necessidade de maior complexidade
diagnóstica ou terapêutica, a equipe aciona a regulação para
agendamento na atenção especializada, como os Centros de
Especialidades Odontológicas (CEO) ou ambulatórios de outras
especialidades. Nos casos que requerem procedimentos de alta
complexidade ou urgência/emergência, o cuidado é direcionado
ao nível hospitalar. Após a intervenção, a contra referência
documentada devolve o usuário à APS, que retoma o plano
terapêutico e o acompanhamento, fechando o ciclo da linha de
cuidado.
Contudo, na prática cotidiana, profissionais da APS enfrentam
casos clínicos complexos que demandam apoio especializado para
tomada de decisão segura e para definir, com critério, a
necessidade real de encaminhamento para atenção secundária ou
terciária(46). A comunicação formal entre os níveis, muitas vezes
morosa, contribui para atrasos no cuidado, encaminhamentos
desnecessários, sobrecarga dos serviços especializados e
insatisfação dos usuários(6-10).
Diante desse cenário, estratégias que promovam integração
ágil, eficiente e segura entre os níveis de atenção tornam-se
essenciais. O uso de aplicativos de mensagens instantâneas,
como o WhatsApp, configura uma solução de baixo custo e fácil
implementação capaz de qualificar a linha de cuidado ao oferecer
suporte clínico em tempo real, aprimorar a decisão na origem,
qualificar e priorizar encaminhamentos e fortalecer a
resolutividade da APS, desde que amparado por regras claras e
aderente à legislação de proteção de dados(11).
Com base nessa premissa, foi estruturada uma estratégia de
apoio diagnóstico e terapêutico que organiza grupos por
especialidades odontológicas e define fluxos de discussão de
casos, garantindo ambiente seguro para a exposição de dúvidas
e compartilhamento de informações clínicas objetivas, sempre em
conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD)(11).
Espera-se, com isso, reduzir encaminhamentos desnecessários,
priorizar adequadamente casos que exigem atenção
especializada, encurtar o tempo de resposta entre os níveis e
assegurar a contrarreferência oportuna para continuidade do
cuidado na APS.
A iniciativa apresenta potencial adicional para educação
permanente na Rede de Atenção à Saúde, fortalecendo o trabalho
colaborativo, e mostra-se replicável em outros contextos por
utilizar tecnologia amplamente disponível. Tais características a
tornam um exemplo prático de integração e inovação
organizacional no cuidado em saúde bucal no SUS.
O objetivo desse estudo é avaliar a implementação de um
programa de teleconsultoria via aplicativo de mensagens entre
equipes da APS e especialistas em saúde bucal, quanto à
resolutividade na APS, priorização clínica e integração com a
regulação em rede municipal.
MÉTODO
Tipo de Estudo
Trata-se de um estudo observacional retrospectivo com
análise de dados secundários de uma intervenção em saúde bucal,
no contexto de avaliação de implementação.
Cenário, Período e Amostra
O cenário é a rede municipal sob gestão da Organização Social
de Saúde CEJAM (São Paulo), com profissionais da APS e
especialistas da atenção secundária organizados em grupos por
especialidade odontológica (ex.: Pacientes com Necessidades
Especiais, Prótese, Ortodontia/Ortopedia, Periodontia,
Endodontia, Cirurgia Oral Menor, Estomatologia, Dor Orofacial,
Implantodontia).
Foram analisados todos os casos discutidos entre agosto de
2021 e julho de 2025 (n=226), sem amostragem. Elegibilidade:
incluímos postagens da APS com resumo clínico mínimo
(anamnese sintética e hipótese diagnóstica) e, quando existente,
imagens com consentimento; excluímos duplicatas e casos sem
dados mínimos.
Protocolo de Pesquisa
A intervenção consistiu no uso estruturado de aplicativo de
mensagens instantâneas para teleconsultoria entre níveis de
atenção, com fluxo padronizado: o profissional da APS descrevia
o caso (sem identificadores pessoais), anexava documentos/
imagens autorizadas quando pertinentes e formulava a dúvida; o
especialista respondia com orientação clínica imediata, hipóteses
diagnósticas diferenciais, condutas recomendadas e critérios de
necessidade/prioridade de encaminhamento, alinhados à
regulamentação da teleodontologia(12).
Importante salientar que os especialistas participantes dos
grupos atuaram de forma voluntária e não remunerada, sem
vínculo financeiro com o projeto, foram previamente orientados
sobre limites de atuação e registro das recomendações, além de
terem assinado termo de ciência para participação voluntária na
estratégia.
A estratégia foi desenhada para qualificar a decisão clínica na
APS e evitar encaminhamentos desnecessários quando o manejo
local fosse seguro alinhada à evidência de que teleconsultorias
em saúde bucal aumentam a resolutividade e reduzem a
necessidade de referência presencial(13).
O desfecho primário foi a taxa de resolutividade na APS. Os
desfechos secundários incluíram a taxa de priorização na atenção
secundária e a proporção de pacientes encaminhados via
regulação. Adicionalmente, será descrito o tempo de resposta do
especialista como indicador de processo e será coletado feedback
dos profissionais sobre o apoio e a resolutividade dos casos.
Não foram avaliados desfechos clínicos diretos do paciente,
nem dados de custo-efetividade ou tempo até o atendimento
especializado que permanecem como agenda futura de
investigação.
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Rev. Tec. Cient. CEJAM. 2025;4:e202540040
Aspectos Éticos e de Integridade
Para governança de dados, adotaram-se salvaguardas
institucionais: minimização (apenas dados estritamente
necessários), anonimização/desidentificação nas conversas,
controle de acesso aos grupos e registro em prontuário das
orientações clinicamente relevantes. Todo o fluxo observou a
LGPD(11).
A coleta foi operacionalizada por formulário padronizado e os
registros foram consolidados em banco eletrônico (instância
institucional), com trilhas de auditoria e perfis de acesso. Não foi
necessária submissão ao CEP/Plataforma Brasil, uma vez que a
base analisada continha apenas dados totalmente anonimizados,
sem qualquer possibilidade de identificação dos participantes(11).
RESULTADOS
Foram analisados 226 casos discutidos entre agosto de 2021
e julho de 2025, provenientes das equipes da APS e
encaminhados para discussão nos grupos especializados de saúde
bucal (Pacientes com Necessidades Especiais (PNE), Prótese,
Ortodontia/Ortopedia, Periodontia, Endodontia, Cirurgia Oral
Menor (COM), Estomatologia, Dor Orofacial (DOF) e
Implantodontia). Destes, 44,69% (n=101) dos casos tiveram
origem na região de M'Boi Mirim e 55,30% (n=125) na região de
Campo Limpo, conforme ilustrado na Figura 1.
Figura 1 - Número de casos por especialidade (n=226), São
Paulo, Brasil, 2025.
Pacientes com Necessidades Especiais (PNE), Cirurgia Oral Menor
(C.O.M.), Dor Orofacial (D.O.F.).
Fonte: base de dados própria, 2025.
A distribuição foi heterogênea, com predomínio de
Estomatologia (n=104 casos; 46,0%) e Pacientes com
Necessidades Especiais PNE (n=50; 22,1%), que juntas
concentraram 68,1% das discussões (figura 1). Volumes
intermediários apareceram em Cirurgia Oral Menor (COM) (n=26;
11,5%), Endodontia (n=21; 9,3%) e Prótese (n=18; 8,0%).
Houve baixa demanda registrada em Periodontia,
Implantodontia e Dor Orofacial (2 casos cada; 0,9%), e em
Ortodontia (n=1; 0,4%). Esse padrão sugere maior uso do canal
para questões diagnósticas e condutas frente a lesões orais
(Estomatologia) e para casos de maior
complexidade/vulnerabilidade (PNE), enquanto áreas tipicamente
eletivas (p.ex., Ortodontia e Implantes) tendem a acionar o
suporte com menor frequência (Figura 2).
Figura 2 - Visualização do desfecho dos casos (n=226), São
Paulo, Brasil, 2025.
Fonte: base de dados própria, 2025.
A Resolução na APS refere-se aos casos cuja condução pode
ocorrer integralmente na UBS, sem necessidade de
encaminhamento, com a teleconsultoria orientando diagnóstico,
terapêutica, ajustes de manejo e seguimento no território.
A Regulação abrange situações em que, após a discussão,
indica-se referência formal para níveis de maior complexidade
(secundária, terciária ou quaternária), por demandarem recursos
não disponíveis na APS.
A Priorização diz respeito aos casos que, além da
necessidade de referência, apresentam gravidade ou risco de
agravamento que justificam atendimento urgente em serviços
especializados (como o CEO), com definição do grau de prioridade
e orientações para agilizar o acesso.
Outros, contempla condições em que a melhor conduta
não é odontológica, exigindo avaliação ou intervenção de outra
área (por exemplo, clínica médica, dermatologia,
otorrinolaringologia ou saúde mental), com orientação clara à
equipe da APS sobre o percurso assistencial adequado.
Segundo demonstrado na Figura 2, todos os casos
apresentados tiveram devolutiva e assim os devidos desfechos
(n=226). Notou-se que 31,0% (n=70) dos casos podiam ser
resolvidos integralmente na própria UBS.
A maioria (69,0%; n=156) demandou encaminhamento para
outros pontos da rede: entre esses, 60,9% (n=95) receberam
priorização para atendimento urgente em serviços especializados
(Centro de Especialidades Odontológicas - CEO), 28,2% (n=44)
indicaram que precisavam ser encaminhadas via regulação para
especialidades/níveis de maior complexidade, seja na rede de
especialidades ou hospitalar, e 10,9% (n=17) foram direcionados
para outras áreas não odontológicas.
Não foram registrados eventos adversos clínicos relacionados
às orientações fornecidas, e todos os registros analisados
permaneceram anonimizados, sem identificação de incidentes de
privacidade. Esses achados corroboram a viabilidade da estratégia
como apoio rápido e seguro para qualificar a decisão clínica na
APS, reduzir encaminhamentos desnecessários e melhorar a
priorização dos casos que requerem atenção especializada.
Teleconsultoria por aplicativo entre níveis de atenção em saúde bucal no SUS...
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Rev. Tec. Cient. CEJAM. 2025;4:e202540040
DISCUSSÃO
Dos 226 casos discutidos nos grupos de discussão clínica das
especialidades odontológicas, observa-se que 44,69% (n=101)
casos tiveram origem na região de M'Boi Mirim e 55,30% (n=125)
na região de Campo Limpo. Essa distribuição, embora
aparentemente próxima em termos absolutos, deve ser analisada
com cautela, considerando alguns fatores que podem influenciar
a demanda e a frequência de participação das equipes.
Em primeiro lugar, é importante reconhecer que cada região
apresenta um número distinto de Unidades de Saúde, o que
naturalmente impacta o volume de casos encaminhados ou
discutidos. Regiões com maior número de unidades tendem, por
consequência, a gerar mais situações clínicas que necessitam de
apoio especializado.
Um aspecto relevante refere-se à qualificação e ao perfil dos
profissionais inseridos em cada território. Diferentes trajetórias de
formação, experiências prévias e graus de segurança clínica
podem levar a maior ou menor necessidade de suporte por meio
da discussão em grupo.
Assim, a concentração de casos em determinada região não
deve ser interpretada isoladamente como maior demanda clínica,
mas também como reflexo da forma como os profissionais
utilizam esse canal de apoio. Além disso, deve-se considerar o
caráter aleatório dos casos clínicos que surgem no cotidiano das
equipes. Situações específicas de maior complexidade podem, em
determinados períodos, se concentrar em uma região por fatores
circunstanciais e não necessariamente estruturais.
A análise dos resultados evidencia que a maior demanda por
teleconsultoria concentrou-se nas especialidades de
Estomatologia (46,0%) e no atendimento a Pacientes com
Necessidades Especiais PNE (22,1%). Esse predomínio pode ser
atribuído à elevada complexidade clínica que caracteriza ambas
as áreas, as quais exigem do cirurgião-dentista competências
técnicas especializadas e sólida capacidade de tomada de decisão.
Na Estomatologia, destacam-se a necessidade de avaliação
minuciosa de lesões orais, definição de condutas frente a
condições potencialmente malignas e manejo de processos
inflamatórios ou infecciosos com repercussões sistêmicas. no
atendimento a PNE, somam-se os desafios relacionados às
múltiplas comorbidades, ao risco de interações medicamentosas
e à adaptação de protocolos frente a limitações físicas, cognitivas
ou comportamentais. Em ambos os contextos, a teleconsultoria
oferece suporte qualificado, contribuindo para a segurança do
paciente e para a resolutividade dos casos na Atenção Primária à
Saúde(14-15).
Embora 31,0% dos casos terem sido resolvidos integralmente
na unidade de origem, esse contingente ainda representa
encaminhamentos que poderiam se evitados e que, em condições
usuais, ocupariam vagas de consultas especializadas de forma
indevida e prolongando filas. Evidências nacionais mostram que a
teleconsultoria em saúde bucal reduz encaminhamentos em
>45% e muda a conduta inicial em ~64% dos casos, reforçando
esse efeito de ordenação do acesso(15-16).
Entre os casos que necessitam referência (69,0%), a
priorização de urgência atribuída à maioria (60,9% dos
encaminhados) mostra que o canal capturou situações não triviais
para o cotidiano da APS e agilizou o acesso dos pacientes com
maior gravidade a serviços como o CEO.
Além disso, a integração com a regulação (28,2% dos
encaminhados seguiram via fluxo formal) demonstra que o
programa não cria um fluxo paralelo, mas qualifica o percurso
assistencial, conectando orientação imediata com o mecanismo
oficial de referência. O subgrupo “Outros” (10,9%) evidencia
outro valor do arranjo: evitar iatrogenias organizacionais ao
reconhecer condições cujo destino assistencial não é
odontológico, preservando recursos e orientando a equipe da APS
para o ponto de cuidado adequado.
Esse arranjo é particularmente relevante porque parte das
queixas que mimetizam dor dentária tem origem não
odontogênica por exemplo, alterações cardíacas, esofágicas,
tireoidianas ou pulmonares e requer encaminhamento médico
oportuno, sob risco de intervenções odontológicas
desnecessárias(17).
Do ponto de vista assistencial, a estratégia aumentou a
assertividade do direcionamento e reduziu a variabilidade das
condutas iniciais. O relato padronizado do caso, o uso de imagens
autorizadas quando pertinentes e a devolutiva registrável no
prontuário favoreceram um efeito educativo contínuo sobre as
equipes, com ganhos em raciocínio diagnóstico e manejo inicial(18-
19). Para além disso, revisões sistemáticas indicam que a
comunicação assíncrona e o uso de fotografias (inclusive por
smartphones) são factíveis e úteis para triagem, diagnóstico e
planejamento terapêutico, quando obedecidos padrões
adequados(15).
Do ponto de vista gerencial, os achados sugerem que a
teleconsultoria é um dispositivo de baixo custo e alta capilaridade
para ordenar o acesso, ao mesmo tempo em que produz dados
operacionais (resolutividade, prioridades, tempos de resposta)
úteis para gestão de filas e planejamento de oferta especializada
alinhado a experiências de Telessaúde no SUS que articulam
teleconsultoria à regulação e à gestão do cuidado no estado da
Bahia, Brasil(20).
Alguns pontos críticos emergem como oportunidades de
aprimoramento: primeiro, a predominância de dúvidas em
Estomatologia e PNE recomenda protocolos rápidos e checklists
de dados mínimos para esses temas (lesões orais, dor, triagem
de risco em pacientes vulneráveis), o que tende a elevar a
resolutividade local sem comprometer a segurança; segundo, a
padronização de critérios de prioridade no próprio ato da
teleconsultoria pode estreitar ainda mais o acoplamento com a
regulação, reduzindo retrabalho; e terceiro, consolidar boas
práticas de imagem (qualidade, enquadramento, consentimento)
diminui idas e vindas, encurta o tempo até a orientação útil e
melhora a documentação clínica.
A segurança do arranjo foi evidenciada pela ausência de
eventos adversos relacionados às orientações e pelo manejo
anonimizado dos registros, o que reforça a viabilidade do uso
cotidiano na rede. Ainda assim, é essencial manter salvaguardas
institucionais: minimização de dados nas conversas, proibição de
identificadores pessoais, registro das condutas clinicamente
relevantes no prontuário e capacitação periódica sobre limites da
teleconsultoria (apoio à decisão, não substituição de consulta
presencial quando necessária).
Limitações do Estudo
Apesar dos achados consistentes, o estudo apresenta
limitações metodológicas que exigem cautela na generalização
dos resultados. O delineamento observacional e retrospectivo,
sem grupo controle ou aplicação de métodos estatísticos
inferenciais, limita a possibilidade de estabelecer relações causais
diretas entre a intervenção e os desfechos observados.
O reconhecimento crítico desses vieses não apenas fortalece a
integridade metodológica do estudo, mas também contribui para
Teleconsultoria por aplicativo entre níveis de atenção em saúde bucal no SUS...
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Rev. Tec. Cient. CEJAM. 2025;4:e202540040
uma compreensão mais ampla e reflexiva sobre as limitações
inerentes à produção de conhecimento em contextos reais de
cuidado(21).
Existe potencial viés de seleção, dado que apenas os casos
voluntariamente apresentados pelas equipes da APS foram
analisados o que pode refletir maior engajamento, acesso
tecnológico ou qualificação clínica em determinados territórios.
Para mitigar esse risco, o estudo incluiu sistematicamente todos
os casos discutidos durante o período analisado, desde que
cumprissem critérios mínimos padronizados, evitando seleção
subjetiva dos registros.
No que se refere ao viés de informação, decorrente do uso de
registros operacionais e auto-relatos, o estudo adotou
padronização rigorosa dos relatos clínicos, registro estruturado
em banco eletrônico com trilha de auditoria e registro das
orientações relevantes em prontuário eletrônico, conferindo
rastreabilidade e integridade aos dados.
Em relação ao viés de desempenho, destaca-se a possibilidade
de efeito Hawthorne em que os profissionais, ao saberem que
participam de uma intervenção estruturada, podem alterar seu
comportamento clínico. Embora esse risco não possa ser
eliminado em estudos do tipo, ele foi minimizado pela inserção da
teleconsultoria como ferramenta de rotina, com fluxo natural e
contínuo de uso durante um período extenso de quatro anos,
reduzindo o caráter artificial da intervenção(22).
Adicionalmente, cabe destacar que os desfechos avaliados
estão centrados em processos assistenciais como resolutividade
na APS, priorização e fluxo de encaminhamento, sem
mensuração direta de desfechos clínicos objetivos (ex.: melhora
de sintomas, tempo até o atendimento efetivo, evolução dos
casos) ou indicadores de experiência do paciente.
Essa limitação restringe a compreensão do impacto final da
intervenção na qualidade do cuidado. Ainda assim, o estudo
contribui de forma relevante ao demonstrar a viabilidade,
segurança e aplicabilidade de uma estratégia de teleconsultoria
baseada em aplicativo de mensagens, com potencial de replicação
em outros contextos do SUS(23).
Contribuições para a Ciência
A adesão à LGPD, a anonimização rigorosa dos dados, o uso
de critérios operacionais claros e o envolvimento voluntário de
especialistas sem conflito de interesses, agrega solidez ética e
metodológica ao trabalho.
Reconhecendo os limites do delineamento, o grupo de autores
planeja dar continuidade à pesquisa por meio de estudos
prospectivos, análises do tipo pré/pós-intervenção e uso de
métodos estatísticos inferenciais, incorporando também
desfechos clínicos, econômicos e de experiência do usuário. Tais
avanços serão fundamentais para consolidar a teleconsultoria
como ferramenta estratégica de coordenação do cuidado em
saúde bucal no SUS, colaborando para o fortalecimento da RAS.
Em síntese, os dados demonstram que o programa qualifica
decisões na APS, evita encaminhamentos desnecessários, prioriza
com base clínica os casos que exigem atenção especializada e
integra-se ao fluxo regulado, contribuindo para uma rede mais
resolutiva e rápida. Com ajustes operacionais pontuais e
expansão de protocolos temáticos, a estratégia tem potencial para
ampliar ainda mais a segurança e a eficiência do cuidado em
saúde bucal.
CONCLUSÃO
O programa de teleconsultoria via aplicativo de mensagens
mostrou-se viável, seguro e clinicamente útil para apoiar a
tomada de decisão na APS e ordenar o acesso à atenção
especializada em saúde bucal.
Ao permitir discussões rápidas e estruturadas entre equipes
da APS e especialistas, a estratégia aumentou a assertividade do
direcionamento, evitou encaminhamentos desnecessários e
viabilizou a priorização de casos graves, contribuindo para
percursos assistenciais mais ágeis.
A ausência de eventos adversos relacionados às orientações e
o manejo anonimizado dos registros reforçam sua adequação ao
uso cotidiano, com aderência às salvaguardas de proteção de
dados.
Do ponto de vista assistencial e gerencial, os achados indicam
que a teleconsultoria funciona como um método clínico de triagem
de baixo custo e alta capilaridade, reduzindo incertezas da APS,
padronizando condutas iniciais e gerando informações
operacionais úteis (resolutividade, prioridade, integração com a
regulação) para a gestão de filas e o planejamento da oferta
especializada.
O padrão de uso concentrado em Estomatologia e em PNE é
coerente com a complexidade dessas demandas e sugere que
protocolos rápidos, checklists de dados mínimos e boas práticas
de imagem podem ampliar ainda mais a resolutividade local sem
comprometer a segurança.
Apesar das limitações inerentes ao delineamento
observacional e ao contexto único de implementação, os
resultados sustentam a manutenção e a expansão do programa,
com integração cada vez mais estreita aos fluxos regulatórios e
ações de educação permanente para as equipes.
Recomenda-se, para etapas futuras, incorporar o
acompanhamento de desfechos clínicos e de experiência do
paciente, medir tempo até o atendimento especializado e avaliar
custo-efetividade, de modo a qualificar a tomada de decisão em
políticas públicas e consolidar a estratégia como componente
estável da coordenação do cuidado em saúde bucal.
CONTRIBUIÇÃO DO AUTORES
Transparência na contribuição segundo a Taxonomia CRediT:
Funções de autoria
Contribuição
Conceitualização
Francis Henrique do Nascimento Tsurumaki; Ernani
Pereira da Cunha
Curadoria de dados
Francis Henrique do Nascimento Tsurumaki; Ernani
Pereira da Cunha; Samuel Nilo Vieira; Fernanda
Cardoso Fernandes; Adrianne Stein
Análise formal
Francis Henrique do Nascimento Tsurumaki
Aquisição de financiamento
Não aplicável
Investigação
Francis Henrique do Nascimento Tsurumaki; Ernani
Pereira da Cunha; Samuel Nilo Vieira; Fernanda
Cardoso Fernandes; Adrianne Stein
Metodologia
Francis Henrique do Nascimento Tsurumaki; Ernani
Pereira da Cunha
Administração do projeto
Francis Henrique do Nascimento Tsurumaki; Ernani
Pereira da Cunha
Recursos
Não aplicável
Software
Não aplicável
Supervisão
Francis Henrique do Nascimento Tsurumaki
Validação
Francis Henrique do Nascimento Tsurumaki; Ernani
Pereira da Cunha; Samuel Nilo Vieira; Fernanda
Cardoso Fernandes; Adrianne Stein
Visualização
Francis Henrique do Nascimento Tsurumaki
Escrita - esboço original
Francis Henrique do Nascimento Tsurumak; Samuel
Nilo Vieira; Fernanda Cardoso Fernandes; Adrianne
Stein
Escrita - revisão e edição
Francis Henrique do Nascimento Tsurumaki; Ernani
Pereira da Cunha
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DECLARAÇÕES
Funções de autoria
Contribuição
Conflitos de interesse
Não aplicável
Financiamento
Não aplicável
Aprovação ética
Não aplicável
Agradecimentos
Com sincera estima, os autores agradecem à equipe
de apoio técnico odontológico Dra. Luciana Barbosa
de Aquino, Dr. Matheus Racy Mariusso, Dra. Nathalia
Tuany Duarte, Dra. Isis Raquel Ghelardi, Dr. André
Luis Seferian Obice, Dr. Carlos Rangel de Moura
Oliveira, Dr. José Renato Ribeiro Pinto, Dra. Fernanda
Talib Guimarães, Dr. Theron Zamboni, Dra. Simone da
Silva Rodrigues, Dr. Marcelo Augusto Fonseca, Dr.
Eduardo Mecys Paleckis, Dra. Regina Celia Furukava
Shin, Dra. Melissa Camacho Martins Rogenski, Dr.
Djalma Saturno Barboza junior, Dra. Aline Cristine
Munhoz Lopes, Dra. Lilian Caldas Quirino, Dr. Victor
Hironori Kinoshita, Dra. Beatriz Venancio Queiroz, Dr.
Marcos Fernandes Galvez Fusteros, Dr. Leandro Toyoji
Kawata, Dra. Ligia Gonzaga Fernandes, Dr. Frederico
Buhatem Medeiros, Dra. Thais Rime Romagna Ventre
e Dra. Amanda Garcia Higa pela dedicação,
disponibilidade e valiosas contribuições técnicas que
qualificaram cada etapa deste projeto. Estendemos
nosso reconhecimento à equipe de apoio técnico-
administrativo, em especial a Danilo Cardozo Borges e
Jefferson Vinicius de Souza Almeida, pelo suporte
eficiente na organização dos processos e pela
colaboração constante
Preprint
Não aplicável
Uso Inteligência Artificial
Não aplicável
REFERÊNCIAS
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